Tenente Miguel
Quando o Estado Se Rende ao Crime
A Legalização Velada do Armamento do Tráfico no Brasil
Quando o Estado Se Rende ao Crime
A Legalização Velada do Armamento do Tráfico no Brasil
Por Miguel Marx
Na mais recente reviravolta jurídica brasileira, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reacendeu o debate sobre os limites da Justiça e a segurança pública. De acordo com o entendimento firmado, quando armas de fogo são usadas para garantir o sucesso do tráfico de drogas, o crime de posse ilegal de arma é 'absorvido' pelo tráfico, com base no chamado princípio da consunção. Na prática, o traficante armado passa a contar com um aval jurídico que minimiza a gravidade de portar um arsenal em nome do crime organizado.
O Brasil, já sufocado pela crescente violência das facções criminosas, agora se depara com o que muitos consideram um golpe mortal contra a ordem pública. Essa decisão, que aplica o artigo 40, inciso IV, da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), prioriza a majorante do tráfico em detrimento do reconhecimento do porte de armas como crime autônomo. O resultado é alarmante: enquanto o cidadão de bem enfrenta barreiras quase intransponíveis para exercer seu direito à legítima defesa, o criminoso recebe uma espécie de 'imunidade jurídica' para portar armas.
O Estado em Xeque
Para entender a gravidade desse cenário, basta imaginar o impacto dessa decisão nos territórios já dominados pelo tráfico. Comunidades inteiras, que vivem sob o jugo de facções, agora presenciam uma legitimação velada do poder armado dos traficantes. Em vez de desarmar os criminosos e recuperar esses territórios para o Estado, a Justiça parece consolidar o domínio das gangues.
Especialistas em segurança pública apontam que a decisão do STJ é, no mínimo, controversa. 'Estamos assistindo à rendição do Estado frente ao crime organizado', afirma um renomado jurista. 'Ao absorver o porte de arma pelo tráfico, a mensagem é clara: o traficante não apenas pode se armar, como essa arma é vista como uma extensão de sua 'atividade profissional'.'
Um País de Contradições
A decisão é ainda mais revoltante para os milhões de brasileiros que acreditam na legítima defesa como direito inalienável. Enquanto o cidadão comum enfrenta uma legislação extremamente restritiva para possuir uma arma, o traficante goza de um cenário jurídico que, na prática, o desobriga de responder por um dos crimes mais graves da atualidade: o porte de armas ilegais.
'É o Brasil das inversões', desabafa um policial veterano, que preferiu não se identificar. 'Você prende um traficante com um fuzil, mas, em vez de ele ser condenado por dois crimes — o tráfico e o porte —, ele responde por apenas um. Isso desmotiva o trabalho policial e empodera o crime organizado.'
O Princípio da Consunção: Justiça ou Pretexto?
O princípio da consunção, base para essa decisão, é um conceito técnico que permite que crimes menores sejam 'absorvidos' por crimes mais graves quando estão interligados. Na teoria, a intenção é evitar a dupla punição por uma mesma conduta. Na prática, no entanto, a aplicação dessa lógica no contexto do tráfico de drogas parece ignorar a realidade de um país onde o armamento das facções é um dos principais motores da violência.
Críticos apontam que o princípio foi distorcido para beneficiar aqueles que desafiam a ordem pública. 'Ao invés de reforçar as penas para o tráfico armado, estamos afrouxando as rédeas. É como dizer ao traficante: Use armas à vontade, desde que seja para vender drogas', denuncia um promotor.
O Sonho da Justiça Acabou?
A frase, que poderia estar escrita nos muros das comunidades dominadas pelo tráfico, reflete um sentimento de desesperança crescente. A cada nova decisão que parece favorecer os criminosos, a confiança da população na Justiça se esvai um pouco mais.
Resta saber até onde o Brasil está disposto a ir nessa trajetória perigosa. O princípio da consunção, concebido como ferramenta técnica, tornou-se um símbolo de um sistema que parece não apenas falhar, mas trair seus próprios cidadãos. Enquanto isso, os traficantes armados celebram o que, para eles, é mais uma vitória no campo jurídico.
O Estado, outrora guardião da segurança, parece ter escudo, espada e balança ao inimigo.
Miguel Marx
Advogado Constitucionalista
Médico mestre em UTI
Pós-graduado em Hematologia, Psiquiatria e Medicina Legail
Comandou o Núcleo de Perícias da UFCA
Coordenou a SST do HRC
Foi chefe de Equipe da UPA24h Juazeiro do Norte
1º Tenente do Exército Brasileiro, Esp. em Inteligência Policial e Prisional
Doutorando pela FMABC
Apaixonado por conhecimento e inovação
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